Os diretores do Fed (Federal Reserve, o Banco Central norte-americano) anunciaram na última quarta-feira (3) o início da retirada do programa de estímulos via compra de títulos criado no ano passado, em meio à crise provocada pela pandemia.
Conhecida como “tapering”, esta retirada implica em menos dinheiro circulando na economia norte-americana e mundial, em um momento em que a inflação avança cada vez mais e preocupa autoridades de todo o mundo.
“A compra de ativos no mercado é o instrumento de injeção de liquidez usado pelo Fed. Com o intuito de controle a curva de juros e sustentar o preço dos mercados, a autoridade monetária adquire ativos como Treasury Notes, T-Bills, Bonds (títulos de dívida do Tesouro) e MBS (títulos de dívida lastreado em hipotecas)”, afirma Renan Zanella, especialista de investimentos da Convex Research.
Nesta última reunião, o Fed decidiu retirar US$ 10 bilhões dos estímulos via títulos do Tesouro (Treasuries) e US$ 5 bilhões em títulos lastreados em hipotecas (Mortgage-Backed Security, ou MBS) a cada mês a partir do final de novembro.
Com isso, a injeção de liquidez mensal foi reduzida de US$ 120 bilhões para US$ 105 bilhões.
“O comitê julga que reduções semelhantes no ritmo de compras de ativos líquidos provavelmente serão apropriadas a cada mês, mas está preparado para ajustar o ritmo de compras caso mudanças nas perspectivas econômicas o justifiquem”, disse o Fed, em comunicado.
Segundo o especialista da Convex, o tapering consiste em deixar os títulos atuais vencerem e reduzir a compra de novos. “Teoricamente, é a política que leva a reversão do Quantitative Easing (QE)”, explica.
O problema é que estes estímulos acabaram se tornando uma espécie de ‘vicio’ para os mercados. “Sabemos que não é saudável, mas diante da menor possibilidade de seu fim, o mercado desaba. Existe até uma expressão chamada “taper tantrum” que reflete essa ‘birra’ dos investidores”, enfatiza Zanella.
No dia 22 de outubro, Jeromy Powell, presidente do Fed, já havia antecipado que o banco central iria começar a reduzir seu programa de compra de títulos, em um cenário de inflação cada vez mais alta nos EUA.
De acordo com ele, as restrições e a escassez da cadeia de abastecimento global que levaram à inflação elevada “devem durar mais do que o esperado anteriormente, provavelmente até o próximo ano”.
Na opinião de Zanella, o discurso de Powell demonstrou como as pressões inflacionárias têm incomodado cada vez mais o Banco Central dos EUA, transmitindo a mensagem de que o risco inflacionário pode ser menos transitório do que o imaginado.
“O Fed apontou para os gargalos de oferta e logística, mas foram os dados divulgados na última semana, com o aumento do custo de emprego, que mais geraram temor no mercado”, disse o especialista.
Na última sexta-feira (29), o Departamento de Trabalho dos EUA divulgou que o índice de custo do emprego (ECI, na sigla em inglês), que mede os custos de mão de obra nos EUA, subiu 1,3% no 3º trimestre. Esta foi a maior alta desde 2001.
Juros se mantém – por enquanto
Ao mesmo tempo em que anunciou a retirada de estímulos, o Fed afirmou que deve manter as taxas de juros entre 0 e 0,25% ao ano e que está preparado para ajustar política monetária, caso surjam riscos.
No entanto, para o especialista da Convex, o aumento dos juros pode acabar acontecendo em breve.
“Se o Fed reforçou que diminuirá os estímulos, mas não aumentará a taxa de juros, outros indicadores da economia americana mostram que o Banco Central pode não ter escapatória. O aumento dos juros do título de 2 anos do tesouro americano e a anomalia ocorrendo no mercado interbancário – US$ 1,3 trilhão de Reverse Repo, instrumento utilizado para enxugar a liquidez – um claro sinal de desequilíbrio nas taxas de juros praticadas”, explicou Zanella.