O surgimento das criptomoedas inaugurou a era das aplicações descentralizadas, que não estão sob controle de nenhuma entidade. A primeira delas foi o próprio Bitcoin (BTC), cujo criador Satoshi Nakamoto nunca revelou sua identidade e sumiu, sem deixar nenhum rastro, quase dois anos depois de lançar o BTC.
Mesmo sem contar com seu criador, a criatura manteve seu crescimento e hoje é a blockchain/criptomoeda mais segura do mundo. Além disso, a falta de um controlador impede que algum governo ou entidade consiga censurar ou bloquear o BTC de alguma maneira.
Contudo, algumas criptomoedas seguiram o caminho oposto, contando com uma forte equipe controladora e um criador ativo e presente. É o caso do Ethereum (ETH), cuja rede segue à risca os planejamentos ditados pela Fundação Ethereum e seu criador, Vitalik Buterin.
Mas, afinal, o que é centralização e descentralização e como esses fatores podem aumentar ou diminuir a segurança de uma criptomoeda?
Centralização vs descentralização
Essas duas palavras dizem respeito a diferentes formas de organização de poder dentro de um sistema. Um sistema centralizado possui seu poder concentrado em um ou poucos indivíduos ou organizações.
Uma empresa, por exemplo, é uma organização centralizada em termos de divisão de poder. Por exemplo, a política monetária do Brasil (e da maioria dos países do mundo) é centralizada em poucos órgãos, entre eles o Banco Central.
O principal grupo de poder neste caso é o Comitê de Política Monetária (Copom), que, entre outras funções, define a taxa de juros brasileira. O Copom é formado por apenas nove membros, sendo oito da diretoria colegiada do Banco Central e o nono membro é o presidente do Banco Central. Esse seleto grupo dita a taxa de juros que valerá para todos os mais de 210 milhões de brasileiros.
Já numa criptomoeda como o BTC, esse poder é mais diluído – especificamente, diluído entre os mais de 10 mil nós da rede, conforme veremos mais adiante. Mesmo se Satoshi Nakamoto reaparecesse hoje mesmo, seu poder seria apenas uma ínfima parte do poder dos nós da rede.
Em outras palavras, quando uma única pessoa ou pequeno grupo de pessoas detêm o poder em um sistema, ele é centralizado. Quando o poder é distribuído entre um grupo muito maior, esse sistema é descentralizado.
Descentralização ou desconcentração
Muitas pessoas acreditam que apenas tirar o poder de um ente centralizado e colocá-lo em uma ou mais pessoas significa que algum sistema é descentralizado. Todavia, existe uma diferença entre a descentralização pura – que existe no caso do Bitcoin – e a desconcentração de poder.
Para entender melhor essa diferença, imagine uma empresa cujas decisões partem apenas de seu diretor executivo. Então, numa mudança de estatuto, a empresa decide diluir o poder do presidente criando um conselho formado por representantes dos acionistas da empresa. O poder, nesse caso, foi desconcentrado das mãos do diretor e diluído para os demais membros do conselho.
No entanto, o conselho ainda é a entidade que controla as decisões da empresa, que, por sua vez, possui milhares de acionistas e empregados. O diretor teve seus poderes limitados, mas a decisão permanece nas mãos de uma única entidade, que agora é o conselho.
Já a descentralização tem uma ausência completa de poder: ninguém tem controle total sobre a rede. No exemplo da empresa, ela seria descentralizada se não tivesse presidente nem um conselho, com os acionistas e até os funcionários tendo em suas mãos o poder de decidir os rumos da companhia.
Isso é exatamente o que acontece com as criptomoedas. Ninguém pode controlar o acesso ao Bitcoin, pois qualquer pessoa pode criar uma carteira ou rodar um nó na rede. Além disso, os milhares de nós que coordenam e aprovam as transações garantem que ninguém tenha o controle individual do Bitcoin, lhe dando um alto grau de segurança.
Fatores que determinam a descentralização
Cabe destacar que descentralização não significa ausência de poder, mas sim fragmentação. No caso do Bitcoin, o poder de decisão está fragmentado entre milhares de usuários espalhados por todo o planeta, e o mesmo vale para outras criptomoedas.
A descentralização de uma criptomoeda pode aumentar ou diminuir conforme a deterioração desses fatores, caminhando rumo a um sistema centralizado. Mas para determinar se uma criptomoeda é centralizada ou não, existem alguns fatores que devem ser levados em conta. Os principais deles são os nós da rede, o hash rate e os maiores holders de criptomoedas.
Número de nós da rede
Os nós são computadores que possuem o software de uma criptomoeda e ajudam a verificar e confirmar as transações. São os nós que impedem que um usuário mal-intencionado possa criar transações falsas e corromper a rede.
Portanto, quanto maior a quantidade de nós que uma criptomoeda possui, mais segura ela será contra esse tipo de fraude. Além disso, se os nós estão espalhados ao redor do mundo – e não concentrados num único país –, o risco de ataque torna-se ainda menor por causa da diversificação geográfica.
De acordo com o site Bitnodes, o Bitcoin possui cerca de 14 mil nós espalhados pelo mundo, sendo que o país com a maior quantidade de nós são os Estados Unidos, que respondem por apenas 13,4% dos nós. Isso faz o risco de um ataque ao Bitcoin causar o colapso da rede ser de praticamente zero.
Mineradores e hash rate
Se os nós protegem uma criptomoeda contra fraudes nas transações, os mineradores protegem a rede contra ataques hackers que possam destruir a criptomoeda. Eles fazem isso utilizando suas máquinas para ceder poder computacional, ou hash rate, que fortalece a rede.
Quanto maior é o hash rate de uma criptomoeda, mais difícil é executar um ataque. O Bitcoin detém cerca de 300 trilhões de hashes em poder computacional, o que é mais do que a soma dos maiores supercomputadores existentes hoje. Ou seja, atacar a rede demandaria um poder de computação superior ao que as maiores máquinas possuem.
Os detentores das criptomoedas
No mercado tradicional, as empresas possuem os acionistas controladores e majoritários, que detêm grandes quantidades de ações. Nas criptomoedas existe algo parecido: os grandes holders, também chamados de baleias no jargão do mercado.
Ao contrário dos grandes acionistas, as baleias não possuem controle sobre a rede em si, mas podem exercer manipulação no preço da criptomoeda. Se um grande investidor resolver vender suas criptomoedas, a venda pode causar uma forte queda no preço dependendo do tamanho.
Se as baleias possuem um grande estoque de criptomoedas (por exemplo, mais de 50% da oferta total), isso pode representar um problema para os pequenos investidores. Por isso, quanto menor for o controle das baleias sobre as criptomoedas, mais essa criptomoeda pode aguentar tentativas de manipulação nos preços.
Em suma, descentralização é uma característica de suma importância para as criptomoedas em todos os aspectos, seja para a segurança, seja para o valor do seu investimento. Portanto, evite ficar exposto a criptomoedas que possuem algum grau de centralização que possa prejudicar seu sistema.