O governo apresentou na semana passada o projeto do novo arcabouço fiscal, que deve substituir o teto de gastos como âncora fiscal no país. A nova regra busca atrelar o crescimento das despesas ao das receitas, estabelecendo uma espécie de intervalo para a meta do resultado primário das contas públicas (saldo entre o que se arrecada e o que se gasta, sem contar o pagamento de juros da dívida).
Quando o governo estiver dentro da meta, os gastos terão crescimento máximo limitado a 70% do crescimento da receita apurada no ano anterior (considerando entre julho de um ano e junho do ano seguinte).
A meta é zerar déficit primário em 2024, com superávit de 0,5% do PIB em 2025 e 1% em 2026. Para 2023, a expectativa ainda é de déficit de 0,5%.
No entanto, para atingir esses resultados será necessário um aumento de arrecadação – e muitos economistas acreditam que isso acontecerá via crescimento de carga tributária, apesar do governo negar.
“Com regra proposta, a dívida pública só se estabilizará com forte aumento de carga tributária”, diz um relatório do BTG Pactual, assinado pelo economista Fabio Serrano.
Segundo ele, com nova regra, e sem aumento de impostos, a dívida bruta terminaria 2035 entre aproximadamente 95% e 100% do PIB. “Elevando a carga [tributária] de forma a cumprir a meta de primário dos próximos 3 anos, dívida estabilizaria em aproximadamente 85% do PIB”, diz o relatório. Ainda assim, esse número é considerado bastante elevado, principalmente se considerarmos que o Brasil não segue a metodologia internacional.
Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o ex-presidente do Banco Central, Celso Pastore, engrossou a lista dos que esperam um aumento de impostos. “Se o governo aprovar esse arcabouço, ele obtém uma licença para aumentar gastos. Se ele não aumentar a carga tributária, o superávit primário não vai ser gerado”, disse Pastore. “ Essa equação só fecha com aumento brutal de carga tributária”, enfatizou o economista.
A equipe econômica do C6 Bank também questiona como será este aumento de arrecadação. “Na nossa avaliação, é muito improvável que as metas de superávit primário sejam cumpridas sem que haja um aumento significativos de arrecadação pelo governo. Considerando que a criação de novos tributos e o aumento da carga tributária foram descartados pelo ministro da Fazenda, então de onde vai vir esse acréscimo nas receitas?”, questionaram, durante o podcast Macro Review.
Na última segunda-feira (3), o ministro da Fazenda voltou a negar que haverá aumento da carga tributária. Segundo ele, o governo vai apresentar três medidas para aumentar as receitas: taxação de apostas eletrônicas, taxação de e-commerces que burlam regras da Receita Federal e proibição de que empresas que tenham incentivos fiscais de estados consigam abater esse crédito da base de cálculo de impostos federais.
A avaliação inicial do mercado sobre o arcabouço
O economista Richard Rytenband, CEO da Convex Research, afirma que o arcabouço nasce mais frágil, por ser implementado via Lei Complementar. “O teto de gastos era uma emenda constitucional e exigia muito esforço por qualquer mudança – por exemplo gastar além do teto”, diz.
Outro ponto destacado pelo economista é o fato do projeto prever aumento real de despesa, ou seja, além da inflação. “Isso era algo que o teto de gastos justamente evitava”, pontua.
Ele também aponta o fato do plano ter um incentivo ao aumento da carga tributária, já que o aumento de receitas libera aumento de despesas.
Matheus Spiess, analista da Empiricus Research, afirma que este “está longe de ser o melhor dos mundos”, mas já enxerga algum avanço. “A gente sabia que seria dessa maneira, pois é preciso dialogar com as alas mais radicais desse governo. Mas tem alguma coisa pelo menos.” afirmou.
Já a equipe do C6 Bank destacou que o teto de gastos (que será substituído pelo novo arcabouço) era uma âncora fiscal “forte, convincente e simples. “Esses atributos são fundamentais para o arcabouço fiscal que deseja ser percebido pelos investidores como crível. Afinal de contas, é isso que o investidor quer. Ele quer ver que a trajetória da dívida brasileira é sustentável e que o risco ao comprar títulos do governo é baixo”, afirmam.
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